sexta-feira, 2 de maio de 2014

ÂMBITO DE ESTÁGIO

SISTEMA NACIONAL DE GESTÃO DE DADOS "Alimentos PT•ON•DATA"






Em termos do trabalho que me foi atribuído para desenvolver no período de estágio a decorrer na ASAE, e de acordo com o que foi referido na publicação referente às funções da minha área de formação, nomeadamente em Saúde Ambiental, o meu trabalho incide especificamente sobre os perigos associados ao consumo de pescado.


Uma das grandes preocupações a nível mundial está associada à contaminação dos mares. Nesse âmbito, e porque grande parte do peixe que chega à mesa dos consumidores portugueses é proveniente do mar, importa identificar quais os perigos associados ao consumo do peixe proveniente desse local e perceber que influencia tem a contaminação marítima a nível de contaminantes (mais especificamente os metais pesados), entre outros perigos.

Assim, correlacionando estas duas áreas, saúde ambiental e segurança alimentar dos consumidores, a parte prática do meu trabalho incide em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente com a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e respetiva caraterização desses mesmos perigos, através da compilação de todos os dados existentes relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA), ou seja no âmbito do controlo oficial em pescado.

Este plano específico insere-se num documento único intitulado de Plano Nacional de Controlo Plurianual Integrado (PNCPI) de âmbito nacional. A sua coordenação é em grande parte da responsabilidade da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) sendo constituído por um conjunto de outros planos específicos de controlo, sendo um deles o PNCA (cuja competência da sua coordenação e execução cabe inteiramente à ASAE). O PNCPI, tem como objectivo assegurar que os controlos oficiais, a nível nacional, abrangem toda a legislação alimentar e todos os géneros alimentícios ao longo de toda a cadeia alimentar. Estes controlos vêm dar conformidade ao disposto no nº2, do artigo 17º do Regulamento (CE) nº 178/2002, relativo às normas de saúde e bem-estar animal, e ao artigo 45º de Regulamento (CE) nº 882/2004, relativo aos controlos oficiais destinados a assegurar a verificação do cumprimento da legislação relativa aos alimentos para animais e aos géneros alimentícios e das normas relativas à saúde e ao bem-estar dos animais.

Fig. 1 - Pescado

O Regulamento (CE) nº 852/2004 estabelece regras gerais de higiene aplicáveis a todos os géneros alimentícios e o Regulamento (CE) nº 853/2004 estabelece regras de higiene específicas para os produtos de origem animal. Como tal, são necessárias regras específicas para os controlos oficiais dos produtos de origem animal, a fim de ter em conta os aspectos específicos associados a estes produtos. Portanto, a elaboração do Regulamento (CE) nº 854/2004 veio estabelecer as regras específicas de organização dos controlos oficiais de produtos de origem animal destinados ao consumo humano. As regras contidas neste regulamento complementam as do Regulamento (CE) nº 882/2004. Aplica-se especificamente às actividades e pessoas a que se aplica o Regulamento (CE) nº 853/2004. Neste diploma é referido o procedimento comunitário referente à aprovação dos estabelecimentos que produzem produtos de origem animal, bem como todos os requisitos específicos para o controlo oficial da carne fresca, moluscos bivalves vivos, produtos da pesca, entre outros. Constam ainda os requisitos aplicáveis aos certificados que acompanham os produtos de origem animal importados.

GRUPO DO PESCADO – ÂMBITO DE ESTÁGIO

A noção de pescado em tecnologia pesqueira chama pescado a todos os seres aquáticos (peixes, moluscos bivalves, crustáceos), suas partes ou produtos, preparados ou não, destinados à alimentação humana. A indústria da pesca imprime uma forte competitividade entre as empresas, acrescida de pressões ao nível das exigências normativas comunitárias no âmbito higio-sanitário, acrescido da competitividade nos mercados nacionais, comunitários e extracomunitários, exigências por parte da distribuição, necessidade de abertura aos mercados exteriores, entre outras. Esta indústria é constituída pelos seguintes subsetores:
  • Preparação e conservação de pescado fresco e congelado; 
  • Salga, secagem e fumagem; 
  • Conservas e semi-conservas; 
  • Farinhas e óleos de peixe; 
  • Outros (cozidos e pré-cozinhados).
Fig. 2 - Pesca industrial
A nível mundial, o setor das pescas apresentou uma evolução mais ou menos constante nestes últimos anos, devido, em grande parte, à produção intensiva da aquicultura, uma vez que, relativamente à pesca em mar, a situação tem vindo a alterar-se em grande parte devido à alteração dos ecossistemas, nomeadamente com a poluição dos mares, a alteração dos cursos de água que transportam alimento para as populações piscícolas, a alteração da atividade piscatória com a introdução de novas metodologias e tecnologias capazes de capturar quantidades elevadas de peixe, com a diminuição dos recursos aquáticos entre outros.

Os produtos da pesca e aquicultura são dos produtos de origem animal mais perecíveis devido essencialmente às suas características intrínsecas, que se alteram rapidamente após a captura do peixe, levando à sua deterioração. A qualidade do pescado é um conjunto de características que o consumidor de pescado consciente ou inconscientemente estima e que deve ter em conta a composição intrínseca, valor nutritivo, grau de alteração, deterioração ocorrida durante o manuseamento, a transformação (quando aplicável), armazenamento, distribuição, venda e apresentação ao consumidor, além das considerações estéticas, rendimento e benefícios ao produtor e intermediários.

Para +info sobre as principais características a verificar na avaliação da frescura do pescado, consultar aqui.


      Consumo de Pescado em Portugal


Em Portugal, pela posição privilegiada no conjunto dos países europeus, devido ao seu posicionamento geo-estratégico, frontal ao Oceano Atlântico, e pelo conhecimento acumulado ao longo de gerações das práticas e técnicas de capturas de espécies marinhas, da sua conservação e transformação e da sua utilização culinária, a pesca e o pescado sempre tiveram uma grande importância socio-económica. Daqui resulta que Portugal, do conjunto dos países da União Europeia, é o que apresenta o maior consumo per capita, com cerca de 56,7 kg/ano, estando também acima da média europeia de 23,1 kg/ano/pessoa (Figura 3). Comparativamente com a média mundial (18,9 kg/ano/pessoa) (Figura 4), os consumos médios europeus de pecado ou marisco são mais elevados.   

Fig. 3 - Consumo de pescado e produtos de aquacultura (2010) por Estado-Membro
Na União Europeia, a espécie de pescado ou marisco mais consumido per capita é o atum em conserva com cerca de 2,14 kg/ano, sendo um peixe capturado totalmente através de pesca selvagem (Figura 5). Três quartos do consumo de pescado ou marisco provém de pescas selvagens, enquanto que os restantes consumos são provenientes da aquacultura.   

Fig. 5 - Principais espécies consumidas na União Europeia (2011)

No entanto, a tarefa de analisar o consumo alimentar específico em Portugal apresenta diversas limitações e dificuldades que se devem essencialmente à inexistência de um inquérito alimentar nacional atualizado.
  • A ferramenta existente sobre dados do consumo alimentar em Portugal, o Inquérito Alimentar Nacional, elaborado pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, data de 1980. Neste estudo a metodologia utilizada para analisar o consumo alimentar foi o registo alimentar de um dia. Em mais de 25 anos os hábitos alimentares foram mudando, quer devido à alteração das condições socio-económicas quer devido às condições políticas decorrentes da integração do país na União Europeia. Assim os dados de consumo provenientes deste inquérito não poderão ser utilizados para retratar o consumo de pescado em Portugal.
  • A Balança Alimentar Portuguesa, elaborada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), é um instrumento analítico de natureza estatística, que permite caracterizar a disponibilidade alimentar e nutricional, segundo os grupos de alimentos existentes em Portugal, mas não fornece dados de consumo. Desta forma, considera-se que apesar de serem os únicos dados mais recentes e disponíveis sobre o pescado em Portugal estes, pelos motivos descritos, apresentam também algumas limitações.
  • Estão também disponíveis os dados do estudo sobre o Consumo Alimentar no Porto. A informação presente neste relatório foi obtida através de um questionário semi-quantitativo de frequência alimentar uma vez que o objetivo é relacionar o consumo alimentar com doenças crónicas, em que o interesse reside no conhecimento da alimentação no passado, não tendo sido, por isso, especificamente desenvolvido com o objetivo primário de descrever hábitos e consumos alimentares da população. A grande limitação do estudo é o fato de ter sido realizado numa amostra da população urbana da cidade do Porto, maior de 18 anos. Ou seja, o estudo é regional, abrange apenas os indivíduos maiores de idade e apenas a residente em zonas urbanas. No entanto, e segundo os autores, não é de esperar que o consumo alimentar seja muito diferente, pelo menos das outras regiões urbanas do país.
  • Uma outra fonte de dados que embora não forneça dados diretos do consumo alimentar na Europa é a DAFNE (Data Food Networking) uma base de dados para a monitorização dos hábitos alimentares na Europa, financiada pela Comissão Europeia. Esta base de dados de consumo alimentar é muito limitada porque não apresenta dados diretos do consumo alimentar da população – baseia-se nos dados dos Inquéritos aos Orçamentos Familiares. Os dados de consumo alimentar fornecidos por este tipo de inquéritos tem por base as aquisições de um determinado agregado familiar dos vários alimentos. Ou seja, não tem em conta quer o desperdício (alimentos deteriorados que não se consomem, a porção não edível dos alimentos) quer os consumos alimentares realizados na hotelaria e restauração.



Pode assim concluir-se que os dados estatísticos existentes são insuficientes para caraterizar adequadamente o consumo de pescado em Portugal. As várias fontes de dados disponíveis apresentam discrepâncias consideráveis entre si.
 
Fig. 6 - Consumo de pescado


Benefícios vs Perigos do Consumo de Pescado


Ao consumo de produtos da pesca são atribuídos inúmeros benefícios nutricionais. Assim, estes produtos são ricos em proteínas de elevado valor biológico e lípidos constituídos por ácidos gordos polinsaturados da família omega-3, em particular os ácidos eicosapentaenóico (EPA) e docosahexaenóico (DHA), os quais se salienta a sua ação benéfica a nível cardiovascular e desenvolvimento fetal.

Todavia, se o valor nutricional do peixe é indiscutível o mesmo já não se passa com o risco de exposição do consumidor a substâncias poluentes que se podem acumular na parte edível. Entre estas substâncias destacam-se as dioxinas e os bifenilos policlorados e seus derivados (PCB), poluentes orgânicos persistentes (POP), e o mercúrio, cadmio, chumbo e arsénio, contaminantes químicos inorgânicos. As fontes destes poluentes no meio aquático podem ser de origem antropogénica, nomeadamente esgotos domésticos, industriais e os provenientes de actividades agrícolas, ou de origem natural, como as provenientes dos processos de erosão dos solos e produtos expelidos nas erupções vulcânicas. Os perigos resultantes da presença destes compostos em ambiente aquático implica não só a sua persistência e toxicidade mas também um grau considerável de concentração na cadeia trófica, o que constitui um fator de risco para a saúde humana.

Fig. 7 - Principais metais pesados encontrados no pescado e que
fazem parte do PNCA no âmbito dos contaminantes químicos

O modo de vida atual envolve o ser humano num ambiente onde a presença de metais tóxicos, ou metais pesados, é permanente e quase sempre invisível. A nossa contaminação torna-se, pois, inevitável e generalizada. Denominam-se metais pesados aqueles metais que não fazem parte da normal constituição do nosso organismo. Por isso, os nossos sistemas metabólicos não sabem como lidar com eles, nem são capazes de os excretar. Assim, os metais tóxicos passam a ser uma causa de perturbação crónica e progressiva das funções metabólicas e celulares. A absorção de metais pesados em doses diminutas, mas repetidas, acaba por se transformar numa intoxicação grave e mensurável.

Numa tentativa de se proteger dos seus múltiplos efeitos prejudiciais, o nosso organismo procura “arrumar” os metais pesados nas células ricas em gordura. Os órgãos mais ricos em gordura são o cérebro, a medula óssea e depois o fígado e os músculos. Compreende-se assim a associação que está estabelecida entre intoxicação por metais pesados e numerosas doenças, com relevo para a diminuição da capacidade cognitiva e doenças degenerativas.

A toxicidade dos metais é devido ao catião (ião com carga positiva – elemento químico instável) e não ao metal (elemento químico neutro, não reativo), sendo a forma iónica que exerce a ação tóxica. O efeito do agente tóxico no nosso organismo depende das suas características (propriedades físico-químicas), das características do ser humano (suscetibilidade biológica) e das condições ambientais.
  

SISTEMA NACIONAL DE GESTÃO DE DADOS - "Alimentos PT•ON•DATA"

 

Situação inicial em Portugal


Não existia uma base de dados analíticos nacional centralizada, pelo que os dados recolhidos estavam dispersos em diversas entidades (ASAE, IPIMAR, LNIV e INIA), em diversos formatos e suportes. Ou seja, cada entidade recolhia os seus dados, em formatos diferentes (papel, Excel, entre outros), e enviava à EFSA para esta os analisar. Pelo fato dos dados serem dispersos e, muitas vezes, a falta de dados importantes, dificultava o trabalho da EFSA na compilação de todos os dados.
















  A entidade em Portugal responsável pela Criação do sistema “Alimentos PT•ON•DATA” é o INSA, e visa a compilação dos dados recebidos de todas as entidades fiscalizadoras nacionais (ASAE, IPMA e DGAV) que depois os remete à EFSA.

Esta compilação de dados efetuada na base de dados – “SSD – Standard Sample Description” em Excel por cada entidade detentora de dados, é enviada para o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge – INSA – que insere os dados recebidos no sistema “Alimentos PT•ON•DATA” e, posteriormente transmite os mesmos à EFSA (Autoridade Europeia de Segurança Alimentar) que analisa os dados recebidos para facilitar a sua consolidação a nível comunitário.



 Como referido anteriormente, a parte prática do meu trabalho incide em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente com a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e respetiva caraterização desses mesmos perigos, através da compilação de todos os dados existentes (especialmente os metais pesados) relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do PNCA.

A nova base de dados deu-se por concluída no final de 2013 e no início de 2014 todas as entidades passaram a utilizar a nova base de dados. Desta forma, a inserção de dados do pescado para a realização do meu trabalho passou já a utilizar o novo modelo.



Espero que a informação vos seja útil.

Próxima publicação: Análise de Riscos Alimentares 


Até Breve!


Fontes:

  1. Riscos e Alimentos – Pescado 
  2. Perfil de Risco dos Principais Alimentos Consumidos em Portugal 
  3. Facts and Figures onthe Common Fisheries Policy
  4. Aplicação do Índice de Qualidade (QIM) na Avaliação da Frescura do Pescado 
  5. Intoxicação por metais – Intoxicação ouReatividade a Metais (Toxicodinâmica de metais pesados) 
  6. Sebenta “Tecnologia da Carne e Pescado” – Licenciatura em Engenharia Alimentar, Instituto Politécnico de Beja
  7. Sebenta “Toxicologia Ambiental” – Licenciatura em Saúde Ambiental, Instituto Politécnico de Beja

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