terça-feira, 22 de abril de 2014

PNCA PARTE 3 – “RESULTADOS NÃO CONFORMES NO PNCA 2012”

Análise crítica e comparativa com os consumos alimentares - Balança Alimentar Portuguesa


Na publicação alusiva ao tema do PlanoNacional de Colheita de Amostras – PNCA – abordei um tópico onde detalhava os resultados não conformes no PNCA 2012.

De seguida vou reproduzir novamente este tópico, inserido na publicação supracitada, de modo a que seja mais fácil visualizar a análise comparativa retirada sobre a correlação entre os resultados não conformes no PNCA e os consumos alimentares dos portugueses, bem como a sua compreensão por parte do leitor. 

“RESULTADOS NÃO CONFORMES - PNCA 2012

No ano de 2012 foram colhidas e analisadas laboratorialmente 1782 amostras, em que 174 amostras apresentaram não conformidades, o que significa que cerca de 10% das amostras colhidas não estavam de acordo com os critérios de segurança harmonizados em matéria de aceitabilidade dos alimentos e/ou com os critérios inerentes à rotulagem ou informação.
Dos vários grupos de géneros alimentícios analisados, face ao número de amostras colhidas, foi o grupo dos cereais que apresentou maior percentagem de não conformidades (20%), seguido do grupo das bebidas alcoólicas (14%), grupo do pescado (13%), grupo da carne (10%), grupo dos produtos lácteos (6%), grupo dos prontos para consumo (6%), grupo dos óleos e gorduras (5%), grupo dos produtos hortícolas (2%), grupo dos frutos secos e secados (2%) e alimentação vegetariana (2%).

Nota: Da análise do Gráfico 1, o grupo das bebidas alcoólicas é o que apresenta o maior número de não conformidades. No entanto, este grupo como não é considerado um grupo de risco, não foi tido em conta na análise supramencionada, sendo o grupo dos cereais, o grupo que apresenta maior percentagem de não conformidades a seguir às bebidas, como indicado no gráfico seguinte.

Gráfico 1 - Tipo de não conformidades nos diferentes grupos de géneros alimentícios no PNCA 2012




1. Das 174 não conformidades detetadas, 38% (66 amostras) correspondem a não conformidades relacionadas com rotulagem, 26% (46 amostras) a não conformidades aos ensaios químicos, 22% (38 amostras) não conformidades aos ensaios microbiológicos e 14% (24 amostras) a não conformidades ao exame sensorial.

Gráfico 2 - Percentagem de perigos químicos encontrados no PNCA 2012
2.    Das não conformidades químicas detetadas, 50% dizem respeito à presença de edulcorantes (21 amostras de bolachas e 2 amostras de produtos de alimentação vegetariana), 39% correspondem ao não cumprimento dos requisitos específicos (18 amostras de bebidas alcoólicas), 9% das amostras apresentaram teores superiores a nitratos (4 amostras de produtos hortícolas) e 2% das amostras correspondem a um teor de aflatoxina que ultrapassava o limite máximo estabelecido (1 amostra de frutos secos). 

Gráfico 3 - Percentagem de perigos microbiológicos encontrados no
PNCA 2012
3.    Das não conformidades microbiológicas detetadas, 57% das amostras apresentaram resultados positivos à Salmonella (4 amostras de produtos à base de carne destinados a serem consumidos crus e 1 amostra de prontos para consumo), 25% com Listeria monocytogenes (4 amostras de produtos à base de carne destinados a serem consumidos crus e 9 queijos) e 18% com E. coli. (7 amostras de moluscos bivalves vivos).

4.    De uma forma geral, em termos de grupos, conclui-se que o grupo das carnes, dos lácteos e do pescado são os que, em termos microbiológicos apresentam maior preocupação. Os géneros alimentícios constantes destes grupos são dos mais consumidos, o que faz com que os consumidores estejam mais expostos aos perigos associados a estes grupos de alimentos face a outros.”

Fig. 1 - Roda dos Alimentos vs Balança Alimentar Portuguesa 2003-2008



Fig. 2 - Roda dos Alimentos vs Balança Alimentar Portuguesa 2008-2012
 
Gráfico 4 - Evolução da percentagem de não conformidades detetadas por grupo no PNCA entre 2009 e 2012














ANÁLISE CRÍTICA

Da análise dos dados acima referidos, o grupo dos cereais foi o grupo de géneros alimentícios com mais não conformidades no ano de 2012 (20% - 33 amostras num total de 166 amostras colhidas neste grupo) (Gráfico 1) e, correlacionando com os dados fornecidos pelas Balanças Alimentares (Figuras 1 e 2), o grupo dos cereais é o grupo mais consumido pelos portugueses.

Portanto, à luz destes dois factos apresentados e sendo dados importantes para uso de um Técnico de Saúde Ambiental, de acordo com as funções que lhe estão atribuídas e descritas na primeira publicação, é importante que sejam reforçados os controlos oficiais deste género alimentício no mercado, bem como a respetiva avalização de riscos, de forma a prevenir potenciais problemas de saúde no consumidor. Esta medida, segundo o Gráfico 4, é possível que tenha sido tomada em consideração porque o nº de não conformidades detetadas no grupo dos cereais aumentou até 2011, o que sugere que a ASAE aumentou o nº de colheitas para análise. Em 2012, verificou-se um decréscimo do nº de não conformidades, sendo um aspeto positivo pois pode significar que as medidas corretivas propostas aos operadores económicos tenham sido postas em prática pelos mesmos.
Por outro lado, os cereais ao fazerem parte da alimentação do nosso dia-a-dia e por constituírem uma importante fonte de hidratos de carbono, a principal fonte de energia para o nosso organismo, é importante também desenvolver, no campo da educação para a saúde, programas de sensibilização para a importância de uma alimentação saudável, equilibrada e variada, abarcando vários grupos etários.
 
Fig. 3 - Diferentes tipos de cereais

Apesar de, no meu âmbito de estágio, não estar inserida no controlo oficial no grupo dos cereais, são assuntos de igual importância como futura Técnica de Saúde Ambiental, em conformidade com o que foi referido na publicação referente às funções da minha área de formação académica.


Relativamente à evolução do tipo de não conformidades detetadas ao longo dos últimos quatro anos no grupo dos cereais, esta tem variado entre a falta de requisitos por não cumprir o estipulado na legislação nacional, não conformidades químicas e não conformidades relativas à rotulagem geral e nutricional.
  • As não conformidades na rotulagem geral e nutricional foi um aspeto que sempre foi encontrado em amostras colhidas no grupo de cereais, tal como se pode verificar no Gráfico 5. Este tipo de não conformidades pode originar a indução em erro do consumidor, podendo até serem suscetíveis de colocar em risco a saúde do mesmo.
o   No ano de 2009, tal como representado nos Gráficos 5 e 6, apenas foram detetadas 4 não conformidades (1 em bolachas e 3 em cereais de pequeno-almoço) relacionadas com diferenças entre o declarado no rótulo e o analisado, e por isso podem induzir em erro o consumidor, mas não são suscetíveis de criar perigo à saúde do consumidor.

o   Em 2010, foi identificado numa 1 amostra de farinha (Gráfico 6) cujo rótulo tinha a menção “isento de glúten” mas ao ter sido analisado laboratorialmente este constituinte (glúten) estava presente no produto, o que pode representar um risco para a saúde dos consumidores que são intolerantes ao glúten.
o   Em 2011, tal como representado nos Gráficos 5 e 6, foram encontradas 7 não conformidades, com 5 amostras de origem chinesa cuja rotulagem não se apresentava traduzida ou corretamente traduzida para a língua Portuguesa. As 2 amostras restantes não cumpriam com o disposto no Decreto-Lei nº 167/2004, no que respeita à informação nutricional presente na rotulagem.

o   Em 2012, tal como representado nos Gráficos 5 e 6, das 12 não conformidades relativas à rotulagem, nas 10 amostras de bolachas e 2 de cereais de pequeno-almoço foram detetadas essencialmente pequenas incorreções ao nível da tradução das menções obrigatórias, essencialmente de produtos de origem chinesa.

  • As não conformidades relativas à falta de requisitos por não cumprir o estipulado na legislação nacional foram detetadas em amostras de arroz colhidas no ano de 2009 e de 2010, tal como se pode verificar nos Gráficos 5 e 6.
  • As não conformidades químicas foram encontradas em 4 amostras de bolachas no ano de 2011 e em 21 amostras de bolachas no ano de 2012, tal como se pode verificar nos Gráficos 5 e 6. Estas não conformidades foram devido à utilização de um edulcorante cuja incorporação não se encontra autorizada para os géneros alimentícios em causa (bolachas).



Um produto ao não ter os requisitos necessários e ao não cumprir as normas e princípios exigidos pela legislação europeia, pode pôr em risco a saúde dos consumidores, trazendo outros problemas adicionais que afetam, indiretamente, os operadores económicos e todos os intervenientes na cadeia alimentar desse produto. A segurança dos alimentos, saúde e bem-estar humano e dos animais e também a fitossanidade são uma das prioridades da União Europeia (UE). Essa prioridade é garantida através de medidas coerentes "desde a exploração agrícola até à mesa" e de uma vigilância adequada, assegurando simultaneamente o funcionamento efetivo do mercado interno.

Fig. 4 - Fungo Aspergillus flavus associado à produção
de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2
No início dos anos 60, a doença X dos perus fez despertar a atenção para o problema das micotoxinas e para as suas implicações na saúde, quando a doença vitimou milhares de perus na Inglaterra. As micotoxinas são metabolitos secundários tóxicos produzidos por diferentes tipos de fungos filamentosos, sendo os principais pertencentes aos géneros Aspergillus, Fusarium e Penicillium, que se encontram difundidos em qualquer parte do mundo, tanto no ar como no solo, infestando plantas vivas e mortas e também animais que se alimentam de plantas contaminadas. A contaminação humana com aflatoxinas resulta diretamente da exposição a alimentos contaminados, ou indiretamente quando proveniente do consumo de leite de animais contaminados pela sua alimentação. Estes compostos são altamente tóxicos, mutagénicos, teratogénicos e carcinogénicos que têm sido considerados como agentes causadores de carcinogéneses hepáticas e extra-hepáticas em humanos.

Os piores efeitos que as micotoxinas podem causar no Homem estão essencialmente associados a toxicidade crónica, pelo que se torna difícil associá-los ao consumo de alimentos contaminados. Os principais sintomas que normalmente se associam são a indução de carcinogénese, depressão do sistema imunitário e lesões a nível do sistema renal, sistema nervoso e endócrino.

Fig. 5 - Plantação de arroz
A presença de micotoxinas em cereais é uma questão que preocupa as autoridades de higiene e segurança alimentar a nível internacional. No caso concreto da cultura do arroz, principalmente o arroz Basmati proveniente maioritariamente do Paquistão e da Índia, a presença de aflatoxinas tem sido detetada em vários mercados europeus, através da rede de alerta rápido RASFF, apresentando níveis muito superiores aos limites máximos admissíveis na União Europeia – Regulamento (CE) nº 1881/2006. Os valores mais frequentemente encontrados para o arroz situam-se entre 5 e 10 μg/kg e os valores mais elevados são superiores a 50 μg/kg. Os principais meses em que ocorrem notificações pelo RASFF por aflatoxinas correspondem aos meses em que ocorrem as monções na Ásia, o que está de acordo com o facto de as micotoxinas serem produzidas por fungos que se desenvolvem mais quando existe humidade relativa elevada. O Paquistão é o principal país de origem do arroz com maior número de notificações devido à presença de aflatoxinas, seguido da Índia e Sri Lanka. Cerca de 50% dos casos ocorrem nos produtos arroz Basmati e Basmati integral que é um tipo de arroz que precisa de envelhecimento para adquirir as suas características aromáticas, podendo nessa fase vir a desenvolver micotoxinas, uma vez que as condições climáticas dos países em que se produzem são propícias ao desenvolvimento de fungos. Na maioria dos casos em que foi detetada a presença de aflatoxinas em arroz, a importação ou não foi autorizada, ou o produto foi retirado do mercado, como forma de salvaguardar a saúde do consumidor. Também quanto à distribuição do produto, as medidas mais tomadas foram a interdição à distribuição ou a restrição ao país notificado. 

A existência de uma grande incoerência dos limites máximos admissíveis a nível mundial vem criar problemas à comercialização de produtos; uma vez que sendo aceites num determinado país podem não sê-lo noutro. Enquanto na União Europeia, o limite máximo admissível (LMA) para aflatoxina (AFB1) é 2 μg/kg e para AF totais é 4 μg/kg, nos Estados Unidos, os valores permitidos são 20 μg/kg para aflatoxinas totais. Já no caso da China, principal produtor e exportador de arroz a nível mundial, o LMA para AFB1 no caso do arroz é de 20 μg/kg e não existe regulamentação para AF totais. A Índia, principal exportador de arroz Basmati, a seguir ao Paquistão apenas apresenta LMA para AF totais e esse valor é de 30 μg/kg, enquanto no Paquistão não existe mesmo regulamentação para aflatoxinas.

Fig. 6 - Estruturas químicas das aflatoxinas B1, B2, G1 e G2
Sendo o arroz um produto de grande consumo em Portugal e particularmente no caso do arroz Basmati que se popularizou nos últimos anos há que assegurar a sua segurança alimentar e nomeadamente demonstrar que está isento de aflatoxinas. Em Portugal, a ASAE está responsável pelo controlo oficial deste tipo de género alimentício no âmbito o Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA). Tal como representado no Gráfico 6, foram colhidas amostras de arroz em 2009 e 2010 que foram submetidas a ensaios para pesquisa de aflatoxinas. Felizmente, todos os resultados vieram conformes com o estipulado pelo Regulamento (CE) nº 1881/2006.

Prevenção da contaminação de cereais por micotoxinas


A melhor forma de evitar a presença de micotoxinas nos alimentos é a prevenção da contaminação da cultura ou do produto armazenado com fungos toxigénicos, pois são estes os responsáveis pelo seu aparecimento. A Comissão Codex Alimentarius (WHO-FAO) estabeleceu em 2003 um Código de boas práticas para prevenção e redução de contaminação de cereais por micotoxinas, incluindo anexos sobre ocratoxina A, zearalenona, fumonisinas e tricotecenos. Esse código devia ser aceite como um guia para prevenir e controlar a contaminação por micotoxinas em cereais. Como aspeto fundamental, o código salienta a necessidade de os produtores compreenderem e aceitarem a importância das boas práticas agrícolas como ponto de partida contra a contaminação por micotoxinas. Para tal, é necessário que as autoridades nacionais tomem as seguintes medidas:
  • dar formação aos produtores no sentido de estes terem em conta as condições ambientais e a maior predisposição para a contaminação por fungos toxigénicos;
  • criar métodos mais rápidos e eficientes para deteção da presença de micotoxinas e planos de amostragem de fácil utilização no terreno;
  • investir em pesquisa científica no sentido de desenvolver métodos e técnicas de prevenção da contaminação por fungos, tanto no campo, como no momento da colheita ou durante o armazenamento.
Devido à sua grande variedade de efeitos tóxicos e também devido à sua elevada resistência ao calor, a presença de micotoxinas em alimentos é considerado um problema de alto risco para a saúde pública e para os animais.

Espero que a informação vos seja útil.

Até Breve!


Fontes:

  1. Relatório Final PNCA 2012
  2. Relatórios Finais PNCA 2009, 2010, 2011
  3. Presença deaflatoxinas em arroz e cereais importados na União Europeia - Revisãobibliográfica e análise de dados RASFF


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