sexta-feira, 16 de maio de 2014

PROJETO ALIMENTO SEGURO - EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE


Como já tem vindo a ser evidenciado em todas as publicações anteriores, em termos do trabalho que me foi atribuído para desenvolver no período de estágio a decorrer na ASAE, e de acordo com o que foi referido na publicaçãoanterior, referente às funções da minha área de formação, nomeadamente em Saúde Ambiental, o meu principal trabalho incide em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e a respetiva caracterização desses mesmos perigos, através da compilação de todos os dados existentes relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do Plano Nacional de Colheita deAmostras (PNCA), ou seja no âmbito do controlo oficial em pescado.

No entanto, outra atividade que me foi atribuída insere-se no campo da educação para a saúde, mediante a realização de ações de formação. A ASAE desenvolveu recentemente, atendendo à sua competência na vertente preventiva, um projeto de promoção e educação para a saúde, realizado em contexto escolar. Este tipo de projeto, como futura Técnica de Saúde Ambiental e devido à minha grande formação como Educadora para a saúde, apresentou especial interesse.

Este projecto, no qual tive o prazer de participar, designa-se “Projeto Alimento Seguro” e assenta em ações de formação, efetuadas em contexto escolar, cujo objetivo é o de promover hábitos saudáveis, nomeadamente reforçando a importância da higiene pessoal, da temperatura de acondicionamento dos alimentos no frigorífico e no processo de descongelamento, tópicos estes que são importantes na prevenção de intoxicações alimentares

Esta iniciativa, que teve início no mês de Outubro de 2013 e que está a ser desenvolvida em parceria com os agrupamentos escolares, já chegou a mais de 3 mil alunos do 1º e 2º ciclo, distribuídos por diferentes escolas do país, e espera chegar a muitos mais.
  • O sucesso que este projeto tem tido junto das escolas, a grande adesão e interesse manifestado pelos alunos, bem como pela experiência direta que tive no Norte do País, nomeadamente em Terras de Bouro, Rio Caldo e Castelo de Paiva, permite-me concluir do êxito desta iniciativa por parte da ASAE. As formações que dei correram de forma bastante tranquila e apesar do “nervoso miudinho” que sentimos, não podemos deixar que o medo de falhar se apodere de nós pois, para além de estar sempre alguém connosco para nos apoiar, também o fato de se trabalhar com crianças ajuda muito e por isso o medo vai diminuindo com o à vontade. O nosso trabalho como Educadores de Saúde é sempre valorizado e reconhecido pelos outros.
A notícia abaixo, publicada no jornal digital “A Verdade” evidencia o sucesso deste projeto. 
Fig. 1 - Notícia - Castelo de Paiva: ASAE apresentou projeto"Alimento Seguro e Mãos limpas"

Assim, devido ao grande acolhimento dos alunos e dos docentes dos agrupamentos escolares para este tipo de incentivos, existem já outras propostas que darão continuidade a este projeto pioneiro e inovador da ASAE. É disso exemplo o projeto “Mãos Limpas”, que algumas escolas solicitaram para ser apresentado, para que os alunos vejam a parte prática da segurança alimentar.


PROMOÇÃO DA SAÚDE


A promoção da saúde é o nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controlo desse processo. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como um objetivo de viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo que engloba os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. 

Ao longo dos anos, o próprio conceito de “saúde” foi evoluindo, passando de uma ideia em que a ausência de doença era a definição de saúde para a noção definida hoje pela Organização Mundial de Saúde como sendo “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afeções e enfermidades”. Assim, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor da saúde médica e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global com condições e recursos fundamentais para a saúde da população, onde fatores políticos, económicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos constituem pré-requisitos numa base para melhorar as condições de vida. Uma alimentação segura e com qualidade faz parte desses pré-requisitos essenciais, onde a área da segurança alimentar representa um meio para alcançar a saúde do consumidor, dando ênfase aos princípios da prevenção e proteção dessa saúde com elevada qualidade e confiança.

Fig. 2 - Cidadania e Saúde
A Cidadania em Saúde emerge, em 1978, da Declaração de Alma-Ata como “o direito e dever das populações em participar individual e coletivamente no planeamento e prestação dos cuidados de saúde”. Neste contexto o cidadão é responsável pela sua própria saúde e da sociedade onde está inserido, tendo o dever de a defender e promover, no respeito pelo bem comum e em proveito dos seus interesses e reconhecida liberdade de escolha (Lei de Bases da Saúde), através de ações individuais e/ou associando-se a instituições. 
  • Como perspetivas estratégicas para o desenvolvimento da Cidadania em Saúde investe-se no reforço do poder e da responsabilidade do cidadão em contribuir para a melhoria da saúde individual e coletiva; reforça-se através da promoção de uma dinâmica contínua de desenvolvimento que integre a produção e partilha de informação e conhecimento (literacia em saúde), numa cultura de pro-atividade, compromisso e autocontrolo do cidadão (capacitação/participação ativa) para a máxima responsabilidade e autonomia individual e coletiva (empowerment). 
A Lei de Bases da Saúde confere especial relevância à adequação dos meios e à atuação do Sistema de Saúde, orientadas para a promoção da saúde e para a prevenção das doenças. Tal facto implica uma conceção integral da saúde e impõe o desafio, aos serviços prestadores de cuidados de saúde, de incorporarem, num quadro de melhoria contínua da qualidade, as ações de promoção da saúde e de prevenção das doenças, da mesma forma que incorporam a prestação de cuidados curativos, reabilitadores ou de cuidados paliativos.

SAÚDE ESCOLAR


«A escola ocupa um lugar central na ideia de saúde. Aí aprendemos a configurar as ‘peças’ do conhecimento e do comportamento que irão permitir estabelecer relações de qualidade. Adquirimos, ou não, ‘equipamento’ para compreender e contribuir para estilos de vida mais saudáveis, tanto no plano pessoal como ambiental (estradas, locais de trabalho, praias mais seguras), serviços de saúde mais sensíveis às necessidades dos cidadãos e melhor utilizados por estes»

(Constantino Sakellarides. in Rede Europeia e Portuguesa de Escolas Promotoras de Saúde. 1999)

«Um programa de saúde escolar efetivo … é o investimento de custo-benefício mais eficaz que um País pode fazer para melhorar, simultaneamente, a educação e a saúde»

(Gro Harlem Brundtland, Diretora-Geral da OMS. Abril 2000)

Em Portugal, cerca de 1841000 alunos frequentam 10300 estabelecimentos de educação e ensino. A escola detém uma posição única que permite melhorar a saúde e a educação de milhares de crianças e jovens. Os fatores que influenciam a saúde das crianças e dos jovens, chamados determinantes da saúde, podem ser agrupados em quatro categorias: genéticos e biológicos, serviços de saúde, comportamentos individuais relacionados com a saúde e caraterísticas sociais. As suas interrelações condicionam o estado de saúde individual e coletivo, pelo que é importante capacitar a comunidade escolar. Capacitar é muito mais do que ter informação de saúde e compreendê-la. É estar habilitado a usá-la e sentir-se competente para tomar decisões. A capacitação da comunidade caracteriza-se pelo aumento das competências dos seus grupos numa perspetiva de avaliação, intervenção e educação sobre os riscos para a saúde, do empowerment assente na melhoria da literacia em saúde e na redução das desigualdades.
  • Na escola, o trabalho de promoção da saúde com os alunos tem como ponto de partida “o que eles sabem” e “o que eles podem fazer” para se proteger, desenvolvendo em cada um a capacidade de interpretar o real e actuar de modo a induzir atitudes e/ou comportamentos adequados.
Em Saúde Escolar, a capacitação da comunidade educativa é o pilar do desenvolvimento do Plano Nacional de Saúde Escolar 2014.

                Escolas Promotoras de Saúde - EPS


No contexto Europeu, a Organização Mundial da Saúde (OMS), no documento Health for all, estabeleceu metas de saúde para os próximos anos, tendo a promoção da saúde e os estilos de vida saudáveis uma abordagem privilegiada no ambiente escolar e os serviços de saúde um importante papel na promoção, prevenção, diagnóstico e tratamento, no que se refere à saúde das crianças e à escolarização. A meta 13 do documento referido prevê que, em 2015, 50% das crianças que frequentem o Jardim-de-infância e 95% das que frequentem a Escola integrem estabelecimentos de educação e ensino promotores da saúde, designadas de Escolas Promotoras de Saúde (EPS). São assim definidas aquelas que incluem a educação para a saúde no currículo e possuem actividades de saúde escolar.
Fig. 3 - Escolas para a Saúde/Escolas
Promotoras de Saúde

  • Portugal integra a Rede Europeia de Escolas Promotoras da Saúde desde 1994, tendo iniciado a sua atividade com uma experiência piloto que, em 1997, os Ministérios da Saúde e da Educação decidiram alargar, criando condições, nomeadamente, legislação e estruturas de apoio, para que os profissionais de saúde e de educação pudessem assumir a promoção da saúde na escola como um investimento capaz de se traduzir em ganhos em saúde.
A Saúde é o resultado da interação entre as pessoas e o seu ambiente, contribuindo as EPS para melhorar as condições de saúde da comunidade educativa, o comportamento individual, a qualidade das relações sociais, a satisfação no trabalho, o ambiente escolar e a imagem da escola. Assim, as intervenções educativas desempenham um papel central no fortalecimento da literacia em saúde, que foi definida como o conjunto de competências cognitivas e sociais que determinam a motivação e a capacidade dos indivíduos para aceder, compreender e utilizar a informação de forma a promover e manter a boa saúde. A literacia em saúde está relacionada com a literacia em geral. O processo de aprendizagem mobiliza o conhecimento e desenvolvimento pessoal para a tomada de decisões no dia-a-dia sobre cuidados de saúde, prevenção de doenças e promoção da saúde, mantendo ou melhorando a qualidade de vida ao longo do ciclo de vida.

                Empowerment – Princípio básico da promoção da saúde


É certo que, nas questões relacionadas com a saúde e com a prestação de cuidados, e na nossa sociedade em particular, continua-se por vezes a assistir à centralização das decisões de saúde nos profissionais, quase em exclusivo, partindo-se da premissa de que a sua atuação se baseia sempre no melhor interesse das pessoas e pelo fato de apenas estes possuírem os conhecimentos necessários, para, numa situação particular de doença, poderem escolher, pelo doente, a conduta mais adequada. No entanto, felizmente tende-se a verificar, já desde algum tempo, uma mudança neste paradigma, tendo-se deslocado a atenção, outrora centrada nos profissionais de saúde, para as pessoas alvo de cuidados, cada vez mais conscientes do papel decisivo que detêm nos assuntos que à sua saúde e à sua pessoa dizem respeito. 

Neste contexto surge o conceito de empowerment, como sendo um método que pretende capacitar a pessoa para a tomada de decisão sobre o seu processo de saúde. Este conceito pode ser um processo de índole social, cultural, psicológica ou política onde os indivíduos e os grupos sociais são capazes de expressar as suas necessidades, apresentar as suas preocupações, planear estratégias que envolvam a tomada de decisões e realizar as acções que permitem ir ao encontro a essas necessidades. A promoção da saúde não engloba apenas ações direcionadas para o fortalecimento das competências básicas e capacidades dos indivíduos, como também influencia as condições sociais, económicas e ambiente físico que têm um impacto na saúde. 

Fig. 4 - Empowerment

Conforme descrito em Health Promotion Glossary / WHO, existem dois tipos de empowerment: individual e comunitário/colectivo.
  • Empowerment individual: refere-se primeiramente à habilidade dos indivíduos para tomarem decisões e terem um controlo sobre as suas vidas pessoais. 
  • Empowerment comunitário/colectivo: envolve os indivíduos a atuarem conjuntamente para ganharem uma maior influência e controlo sobre os determinantes de saúde e a qualidade de vida da sua comunidade. 

Em 1986, a Carta de Ottawa mencionava o empowerment da comunidade como um tema central no discurso da promoção da saúde. Subsequentemente, conferências internacionais em Sundsvall, Adelaide e Jakarta também reforçaram este conceito.

Actualmente, o empowerment dos cidadãos faz parte, em muitos países, das prioridades e políticas de saúde. No entanto, o empowerment da comunidade é, ainda hoje, difícil de medir e implementar como parte da promoção da saúde.



Espero que a informação vos seja útil.

Próxima publicação: Identificação e caracterização dos contaminantes em pescado



Até Breve!


Fontes:

  1. Plano Nacional de Saúde 2012-2016 – Versão resumo
  2. Programa Nacional de Saúde Escolar 2014 – Documento em discussão pública
  3. Programa Nacional de Saúde Escolar
  4. Construindo Escolas Promotoras de Saúde: Directrizes para promover a saúde em meio escolar
  5. Os Enfermeiros E... O Empowerment em Saúde... 
  6. Health Promotion Glossary / WHO
  7. Empowerment do cidadão, em saúde: Qual o papel do profissional de saúde? Qual a percepção do cidadão?
  8. Efeitos do Empowerment Estrutural nos comportamentos de Mobilização de profissionais de saúde e na percepção dos Eventos Adversos Associados aos Cuidados aos Doentes: Uma revisão sistemática da literatura

sábado, 10 de maio de 2014

ANÁLISE DE RISCOS ALIMENTARES

Existem normas e princípios de segurança alimentar que permitem assegurar que os géneros alimentícios colocados no mercado são seguros e com qualidade, de forma a criar confiança tanto nos consumidores, que são o principal enfoque porque são aqueles que vão ingerir o produto final, como nos operadores económicos, na medida do fornecimento de matérias-primas certificadas, seguras e com elevada qualidade de modo a proteger a saúde dos consumidores.

Neste sentido, as medidas adotadas pelos Estados-Membros e pela Comunidade para regular os géneros alimentícios e os alimentos para animais devem geralmente basear-se numa análise dos riscos nas suas três componentes (avaliação, comunicação e gestão de riscos) que, em conformidade com o Regulamento (CE) nº 178/2002, constitui o sistema de organização oficial em vigor na União Europeia (UE) para garantir a segurança da cadeia alimentar, tendo sempre como objectivo um elevado nível de proteção da vida e da saúde humana.
Fig. 1 - Componentes da análise dos riscos




A avaliação de riscos alimentares permite que os Operadores do Setor Alimentar tomem as medidas necessárias para proteger a segurança e a saúde dos consumidores. Porém, o Regulamento (CE) nº 178/2002 reconhece que as decisões em matéria de gestão dos riscos não podem basear-se exclusivamente nas informações fornecidas pela avaliação dos riscos, pelo que devem ser tidos em conta outros fatores pertinentes, como fatores sociais, económicos, tradicionais, éticos e ambientais, assim como a viabilidade dos controlos.

Apesar do objetivo da avaliação de riscos consistir na prevenção dos riscos alimentares, sempre que não seja possível eliminar os riscos, estes devem ser diminuídos e o risco residual controlado.

Fig. 2 - Logotipo da EFSA (Autoridade Europeia
de Segurança Alimentar)
A avaliação dos riscos na Europa está centralizada na EFSA, havendo contudo outras instituições a nível dos EM que também se dedicam a estas questões, tais como a agência inglesa - Food Standards Agency (FSA), a agência francesa - Agence Nationale de Sécurité Sanitaire de L’Alimentation, de L’Environnement et du Travail (ANSES), a autoridade holandesa - Food and Consumer Product Safety Authority (VWA) ou o RIKILT - Institute of Food Safety uma importante instituição científica também holandesa e a instituição científica alemã de avaliação do risco – Federal Institute for Risk Assessment (BfR). Em Portugal, a ASAE é a entidade responsável pela análise dos riscos alimentares, em conformidade com a sua Lei Orgânica (Decreto-Lei nº 194/2012). 

Na UE, no âmbito da gestão dos riscos, desenvolveu-se o RASFF – que é uma ferramenta essencial para gerir incidentes e crises alimentares, permitindo estabelecer o panorama no que se refere às tendências dos perigos de segurança alimentar que afetam os consumidores europeus. Este sistema foi criado para permitir de um modo eficaz a troca de informação relativa aos riscos detetados em alimentação humana e animal e às medidas de resposta tomadas, possibilitando uma actuação mais rápida dos EM. O Relatório RASFF, anualmente publicado, que inclui o tratamento de dados relativos às notificações emitidas relativamente aos alimentos, aos perigos, país de origem envolvido, permite ter uma noção acerca dos perigos, respetivos alimentos, entre outros, que num espaço temporal poderão ser mais importantes, embora tenha que haver cuidado nas conclusões retiradas.

METODOLOGIA UTILIZADA PELA ASAE

Um estudo típico do perfil do risco dos alimentos deverá contemplar, entre outros, o estudo descritivo das seguintes fases ou etapas:
  • Compilação da informação acerca dos alimentos e eventuais perigos a eles associados. Riscos associados aos alimentos e respetivos consumos;
  • Informação relativa aos circuitos de produção e distribuição com referência aos pontos em que os consumidores poderão estar mais expostos aos diversos perigos ou ao modo como os perigos ocorrem na cadeia alimentar;
  • Identificação dos perigos a partir de fontes bibliográficas;
  • Exposição dos consumidores aos perigos - Teores de ocorrência, frequência e distribuição;
  • Incidência dos perigos em diferentes grupos da população;
  • Perceção dos consumidores em relação aos riscos;
  • Contexto Internacional.
  • Medidas de gestão dos riscos.

PERIGOS NA CADEIA ALIMENTAR

A cadeia alimentar é afetada por perigos constituídos por agentes biológicos, químicos ou físicos presentes nos géneros alimentícios ou alimentos para animais, ou uma condição desses agentes, com potencialidades para provocar um efeito nocivo para a saúde. Por outro lado, os riscos (R) são uma função de probabilidade (P) de um efeito nocivo para a saúde e da gravidade desse efeito, como consequência (C) de um perigo.

Fig. 3 - Tipos de perigos que podem ser detetados nos géneros alimentícios ou em alimentos para animais
A existência de perigos veiculados pelos alimentos é uma situação presente no nosso dia-a-dia e cada vez é dada maior importância às consequências nefastas destes perigos, devido às situações patológicas que podem causar. Em conformidade com o artigo 14º do Regulamento (CE) 178/2002 “não serão colocados no mercado quaisquer géneros alimentícios que não sejam seguros”.
  • PERIGOS BIOLÓGICOS – Apresentam o maior risco à inocuidade do alimento e englobam as bactérias, fungos, vírus, parasitas, priões e toxinas microbianas. Estima-se que cerca de 90% das doenças transmitidas por alimentos sejam provocadas por microrganismos. Estes podem-se encontrar em quase todos os alimentos, mas a sua transmissão resulta, na maioria dos casos, da utilização de metodologias erradas nas últimas etapas da sua confeção ou distribuição. A maior parte é destruída por processamentos térmicos e muitos podem ser controlados por práticas adequadas de armazenamento e manipulação, boas práticas de higiene e fabrico, controlo adequado do tempo e temperatura de confeção. No entanto, nem todos os agentes biológicos devem ser considerados como prejudiciais, importa distinguir entre agentes biológicos que causam alterações benéficas nos alimentos - como o caso das leveduras no fabrico de vinho, pão e cerveja (estes só são considerados um perigo quando a fase do processo onde estão inseridos esteja fora de controlo) - e agentes que podem causar um risco na saúde do consumidor (agentes patogénicos) e agentes que interferem na qualidade comercial e tecnológica do produto. 
Fig. 4 - "Limpar/Enxaguar, Separar, Cozinhar e Refrigerar"
Passos básicos para a prevenção de uma contaminação
cruzada e de uma eventual toxi-infeção alimentar













Fig. 5 - Bebidas energéticas - um
perigo emergente?
  • PERIGOS QUÍMICOS – São em regra os mais temidos pelos consumidores e são na sua maioria um conjunto de perigos de origem diversa, desde aqueles que se encontram associados às características das próprias matérias-primas e/ou como consequência de determinada operação, como os resíduos da produção, transformação, acondicionamento, transporte e conservação. Nestes incluem-se os contaminantes de origens industriais (dioxinas, metais pesados), as toxinas naturais (ex. cogumelos, peixes exóticos, marisco) e também os contaminantes resultantes do processamento alimentar, surgindo nos alimentos como subprodutos das diferentes tecnologias. Os perigos químicos podem também decorrer da adição voluntária de produtos usados nos processos de produção primária ou de transformação, tais como os aditivos alimentares (usados em concentrações excessivas), os resíduos de pesticidas, resíduos de medicamentos veterinários e também os materiais usados em contacto com os alimentos, que não sendo completamente inertes, podem ser possíveis fontes de migração de substâncias que se forem transferidas da embalagem para os alimentos poderão constituir um perigo para o consumidor, como é o caso dos ftalatos que têm sido detectados em óleos alimentares. Outros perigos que constituem um risco para a saúde pública são os metais pesados, substâncias naturais vegetais (ex. solanina da batata) e químicos criados pelo processo ou introduzidos no processo (ex. produtos de limpeza e desinfeção). Muitos destes compostos podem alcançar o organismo humano, sendo uma das vias de exposição mais importantes a via alimentar. Uma vez no ambiente, os contaminantes podem ser absorvidos por plantas ou animais da base da cadeia alimentar, que depois serão consumidos por animais dos níveis superiores da cadeia. Deste modo, os alimentos fazem parte do ambiente global susceptível de ser contaminado por agentes químicos de diferentes origens ou fontes.
  •  PERIGOS NUTRICIONAIS – Existe um número cada vez maior de alimentos rotulados e publicitados na Comunidade com alegações nutricionais e de saúde. Por forma a assegurar um elevado nível de protecção dos consumidores e a facilitar as suas escolhas, os produtos colocados no mercado, incluindo os que são importados, deverão ser seguros e devidamente rotulados. Um regime alimentar variado e equilibrado é uma condição indispensável para a manutenção da saúde e os produtos considerados individualmente têm uma importância relativa no contexto do regime alimentar geral.

  • PERIGOS FÍSICOS – Contrariamente às contaminações químicas e microbiológicas, as contaminações físicas são maioritariamente de fácil resolução, quer por parte dos operadores económicos, quer por parte do consumidor, já que normalmente são rapidamente identificáveis. No entanto, quando não são identificáveis e ingeridas com os géneros alimentícios, poderão traduzir-se numa série de complicações na saúde do consumidor, como perfurações ou cortes na boca e língua, danos nos dentes, engasgamento, entre outros. Estes perigos podem provir dos materiais de embalagem e acondicionamento das matérias-primas, de produtos em curso ou produtos acabados, equipamentos e utensílios, dos próprios manipuladores, da deficiente conservação e higiene de estruturas, equipamentos e outros materiais em contacto com os géneros alimentícios e também da inexistência ou ineficácia dos planos de higienização e controlo de pragas e dos procedimentos HACCP. Os perigos físicos mais frequentes são: vidros, madeiras, metais, pedras, materiais de revestimento ou isolamento, plásticos, objectos de uso pessoal, ossos e espinhas.


Tabela 1 - Exemplos de perigos de origem alimentar e potenciais doenças associadas



















AVALIAÇÃO DE RISCO NO GRUPO DO PESCADO – PRINCIPAIS PERIGOS ALIMENTARES


Ao consumo de produtos da pesca são atribuídos inúmeros benefícios nutricionais. Assim, estes produtos são ricos em proteínas de elevado valor biológico e lípidos constituídos por ácidos gordos polinsaturados da família omega-3, em particular os ácidos eicosapentaenoico (EPA) e docosahexaenoico (DHA), os quais se salienta a sua ação benéfica a nível cardiovascular e desenvolvimento fetal. O pescado é igualmente uma excelente fonte de algumas vitaminas, designadamente de A e D, e apresenta também uma enorme variedade de elementos minerais, nomeadamente de iodo (I) e selénio (Se), para além de ser um alimento de digestão fácil e de apresentar um baixo teor de colesterol.
Todavia, se o valor nutricional do peixe é indiscutível o mesmo já não se passa com o risco de exposição do consumidor a perigos que se podem acumular na parte edível do pescado. Dentro destes perigos encontram-se as toxinas que se acumulam no pescado; a contaminação microbiológica do pescado, que pode resultar da contaminação das águas ou do mau manuseamento e/ou conservação e, por último, os contaminantes químicos que se encontram nas águas, de forma natural ou como resultado da actividade antropogénica, e que podem ser transferidos e acumulados no pescado.

De acordo com a nova lei orgânica da ASAE (Decreto-Lei nº 194/2012), a “Área dos riscos na cadeia alimentar” na qual está inserida o Departamento de Riscos Alimentares e Laboratórios (DRAL) tem como uma das suas principais missões a avaliação e comunicação dos riscos na cadeia alimentar.

No âmbito do meu estágio que estou a desenvolver na ASAE no departamento acima referido, de acordo com o que foi referido na publicação referente às funções da minha área de formação, nomeadamente em Saúde Ambiental, e correlacionando com a área da segurança alimentar, o meu trabalho incide especificamente sobre os perigos associados ao consumo de pescado (principalmente os metais pesados). Trabalho este que se insere em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente com a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e respetiva caraterização desses mesmos perigos. Este trabalho assenta na compilação de todos os dados existentes relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA), isto é, no controlo oficial do pescado.

Apesar de existirem muitos perigos associados aos géneros alimentícios, os perigos que serão referidos e identificados no âmbito do PNCA são somente os reconhecidos em diplomas legais e por isso passíveis, em caso de não conformidade, de enquadramento legal.

Contaminação microbiológica – Regulamento (CE) nº 2073/2005

O nível da contaminação microbiológica do pescado no momento da captura depende principalmente da qualidade bacteriológica da água em que o peixe é capturado, existindo vários fatores que influenciam a microflora presente no peixe, designadamente a temperatura da água, o conteúdo em sal, a proximidade das áreas de captura das habitações humanas, quantidade e origem da alimentação consumida pelo peixe e o método de captura. O tecido muscular comestível do peixe é normalmente estéril no momento da captura, encontrando-se as bactérias na pele, guelras e trato intestinal. A partir do momento em que são capturados, as barreiras naturais desvanecem, e a entrada dos microrganismos torna-se facilitada. Neste momento, o cumprimento de todos os requisitos de higiene é fundamental, uma vez que a contaminação bacteriana no pescado pode originar produtos da decomposição na parte edível, que não só são indesejáveis sob o ponto de vista sensorial como também podem provocar problemas de saúde.
   















 (Para +info consultar Parasites (CDC), Parasites in food (EFSA))




Contaminantes químicos – Regulamento (CE) nº 1881/2006


Atualmente, os ecossistemas aquáticos apresentam um grau de degradação acelerado. As marés negras, a poluição causada pela descarga de águas residuais, fertilizantes e pesticidas agrícolas arrastados pelas águas das chuvas, a deposição de resíduos industriais e radioativos, tornaram os mares e oceanos de determinadas zonas do globo, lixeiras a céu aberto, conduzindo ao colapso dos ecossistemas. A elevada resistência à degradação química, física e biológica de muitos destes contaminantes leva a que eles possam persistir no ambiente mesmo depois da proibição quer da sua utilização quer da sua descarga nos cursos de água. Estes compostos apresentam uma bioacumulação e biomagnificação elevadas. Por isso é que os níveis mais elevados são encontrados em tecidos adiposos de espécies animais do final da cadeia alimentar (ex. cavala, atum, salmão). A ingestão destes contaminantes através da alimentação, sobretudo do pescado, pode originar efeitos fisiológicos por vezes graves.







Cádmio e Chumbo

Aponta-se que a sua absorção nos adultos, a partir da dieta alimentar, ao nível gastrointestinal, se situa entre 3 a 8% no caso do Cd e de 5 a 15% no caso do Pb. Segundo um estudo efetuado na ASAE, os níveis médios destes elementos em espécies capturadas e/ou comercializadas em Portugal, como a sardinha, carapau, bacalhau e peixe-espada preto, encontram-se, de uma forma geral, abaixo dos 0,01 mg/kg e de 0,06 mg/kg, respectivamente para o Cd e Pb. Noutras partes edíveis do peixe, tal como o fígado, os níveis de Pb são da mesma ordem de grandeza que os encontrados no músculo mas os de Cd são mais elevados. No que respeita aos crustáceos, como e o caso da sapateira e lagostim, esses teores médios rondam os 0,10 e 0,05 mg/kg, respectivamente para o Cd e Pb. Em relação aos moluscos, cefalópodes e bivalves, o Pb e em particular o Cd apresentam valores superiores destes contaminantes quando comparados com os observados no peixe. As concentrações destes elementos nos moluscos refletem as existentes no ambiente aquático e, desta forma, são tao mais elevadas quanto a zona for mais poluída.

Mercúrio e Metilmercúrio

No que respeita ao Hg, nomeadamente a sua forma orgânica de metilmercúrio (meHg) que representa cerca de 90% do total de Hg no músculo do peixe, é aceite que a principal via de exposição a este composto é a alimentar, através do consumo de pescado. O meHg é um composto lipofílico facilmente absorvido (90 a 95%) ao nível gastrointestinal. A presença de teores elevados de Hg/meHg nos produtos da pesca pode explicar-se pelo fenómeno da biomagnificação. Deste modo, os organismos situados no topo da cadeia trófica apresentam níveis de meHg superiores nos seus tecidos em relação aos organismos que lhes servem de alimento. Assim, os níveis de Hg nestes produtos estão relacionados com diversos fatores como o habitat, a posição da espécie na cadeia trófica, idade e dieta alimentar. De fato, a concentração de Hg/meHg é, em regra, mais elevada em peixes carnívoros quando comparado com os herbívoros. Como exemplo, o peixe-espada preto apresenta valores superiores de Hg total (cerca de 0,60 mg/kg), quando comparado com a sardinha (cerca de 0,03 mg/kg). Entre os crustáceos, o lagostim apresenta valores na ordem dos 0,40 mg/kg, segundo o estudo efetuado na ASAE. É de salientar que o Se, um nutriente que é abundante nos peixes marinhos, parece ter um efeito na biodisponibilidade do mercúrio, sendo por isso associado a uma ação protectora contra os efeitos adversos provocados pelo meHg.


Dada esta problemática da presença de contaminantes nos produtos da pesca e a relevância do consumo destes produtos para a saúde, a quantificação de riscos associados a estes contaminantes torna-se essencial para se obter uma ideia mais precisa da importância do risco e poder equacionar e ponderar os riscos e benefícios associados ao seu consumo. Deste exercício podem ser obtidos os níveis recomendáveis de consumo de um dado produto da pesca.


Espero que a informação vos seja útil.

Próxima publicação: Projeto Alimento Seguro - Educação para a Saúde 


Até Breve!


Fontes:

  1. Riscos e Alimentos – Pescado 
  2. Riscos Biológicos / Riscos Químicos  
  3. Perfil de Risco dos Principais AlimentosConsumidos em Portugal 
  4. Normativo “Plano Nacional de Colheita de Amostras 2012”
  5. Sebenta “Toxicologia Ambiental” – Licenciatura em Saúde Ambiental, Instituto Politécnico de Beja
  6. Risk assessment in the fishing industry / FAO  
  7. Fish contaminants / FAO 
  8. Safety of fish and fish products / FAO 
  9. Avaliaçãode perigos microbiológicos em produtos da pesca importados – Posto de inspecçãofronteiriço do Porto de Lisboa 
  10. Avaliação da contaminação em metais pesadosno pescado: Análise da situação do pescado comercializado em Portugal e dosalertas emitidos pelo sistema RASFF (RapidAlert System for Food and Feed) 

sexta-feira, 2 de maio de 2014

ÂMBITO DE ESTÁGIO

SISTEMA NACIONAL DE GESTÃO DE DADOS "Alimentos PT•ON•DATA"






Em termos do trabalho que me foi atribuído para desenvolver no período de estágio a decorrer na ASAE, e de acordo com o que foi referido na publicação referente às funções da minha área de formação, nomeadamente em Saúde Ambiental, o meu trabalho incide especificamente sobre os perigos associados ao consumo de pescado.


Uma das grandes preocupações a nível mundial está associada à contaminação dos mares. Nesse âmbito, e porque grande parte do peixe que chega à mesa dos consumidores portugueses é proveniente do mar, importa identificar quais os perigos associados ao consumo do peixe proveniente desse local e perceber que influencia tem a contaminação marítima a nível de contaminantes (mais especificamente os metais pesados), entre outros perigos.

Assim, correlacionando estas duas áreas, saúde ambiental e segurança alimentar dos consumidores, a parte prática do meu trabalho incide em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente com a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e respetiva caraterização desses mesmos perigos, através da compilação de todos os dados existentes relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA), ou seja no âmbito do controlo oficial em pescado.

Este plano específico insere-se num documento único intitulado de Plano Nacional de Controlo Plurianual Integrado (PNCPI) de âmbito nacional. A sua coordenação é em grande parte da responsabilidade da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) sendo constituído por um conjunto de outros planos específicos de controlo, sendo um deles o PNCA (cuja competência da sua coordenação e execução cabe inteiramente à ASAE). O PNCPI, tem como objectivo assegurar que os controlos oficiais, a nível nacional, abrangem toda a legislação alimentar e todos os géneros alimentícios ao longo de toda a cadeia alimentar. Estes controlos vêm dar conformidade ao disposto no nº2, do artigo 17º do Regulamento (CE) nº 178/2002, relativo às normas de saúde e bem-estar animal, e ao artigo 45º de Regulamento (CE) nº 882/2004, relativo aos controlos oficiais destinados a assegurar a verificação do cumprimento da legislação relativa aos alimentos para animais e aos géneros alimentícios e das normas relativas à saúde e ao bem-estar dos animais.

Fig. 1 - Pescado

O Regulamento (CE) nº 852/2004 estabelece regras gerais de higiene aplicáveis a todos os géneros alimentícios e o Regulamento (CE) nº 853/2004 estabelece regras de higiene específicas para os produtos de origem animal. Como tal, são necessárias regras específicas para os controlos oficiais dos produtos de origem animal, a fim de ter em conta os aspectos específicos associados a estes produtos. Portanto, a elaboração do Regulamento (CE) nº 854/2004 veio estabelecer as regras específicas de organização dos controlos oficiais de produtos de origem animal destinados ao consumo humano. As regras contidas neste regulamento complementam as do Regulamento (CE) nº 882/2004. Aplica-se especificamente às actividades e pessoas a que se aplica o Regulamento (CE) nº 853/2004. Neste diploma é referido o procedimento comunitário referente à aprovação dos estabelecimentos que produzem produtos de origem animal, bem como todos os requisitos específicos para o controlo oficial da carne fresca, moluscos bivalves vivos, produtos da pesca, entre outros. Constam ainda os requisitos aplicáveis aos certificados que acompanham os produtos de origem animal importados.

GRUPO DO PESCADO – ÂMBITO DE ESTÁGIO

A noção de pescado em tecnologia pesqueira chama pescado a todos os seres aquáticos (peixes, moluscos bivalves, crustáceos), suas partes ou produtos, preparados ou não, destinados à alimentação humana. A indústria da pesca imprime uma forte competitividade entre as empresas, acrescida de pressões ao nível das exigências normativas comunitárias no âmbito higio-sanitário, acrescido da competitividade nos mercados nacionais, comunitários e extracomunitários, exigências por parte da distribuição, necessidade de abertura aos mercados exteriores, entre outras. Esta indústria é constituída pelos seguintes subsetores:
  • Preparação e conservação de pescado fresco e congelado; 
  • Salga, secagem e fumagem; 
  • Conservas e semi-conservas; 
  • Farinhas e óleos de peixe; 
  • Outros (cozidos e pré-cozinhados).
Fig. 2 - Pesca industrial
A nível mundial, o setor das pescas apresentou uma evolução mais ou menos constante nestes últimos anos, devido, em grande parte, à produção intensiva da aquicultura, uma vez que, relativamente à pesca em mar, a situação tem vindo a alterar-se em grande parte devido à alteração dos ecossistemas, nomeadamente com a poluição dos mares, a alteração dos cursos de água que transportam alimento para as populações piscícolas, a alteração da atividade piscatória com a introdução de novas metodologias e tecnologias capazes de capturar quantidades elevadas de peixe, com a diminuição dos recursos aquáticos entre outros.

Os produtos da pesca e aquicultura são dos produtos de origem animal mais perecíveis devido essencialmente às suas características intrínsecas, que se alteram rapidamente após a captura do peixe, levando à sua deterioração. A qualidade do pescado é um conjunto de características que o consumidor de pescado consciente ou inconscientemente estima e que deve ter em conta a composição intrínseca, valor nutritivo, grau de alteração, deterioração ocorrida durante o manuseamento, a transformação (quando aplicável), armazenamento, distribuição, venda e apresentação ao consumidor, além das considerações estéticas, rendimento e benefícios ao produtor e intermediários.

Para +info sobre as principais características a verificar na avaliação da frescura do pescado, consultar aqui.


      Consumo de Pescado em Portugal


Em Portugal, pela posição privilegiada no conjunto dos países europeus, devido ao seu posicionamento geo-estratégico, frontal ao Oceano Atlântico, e pelo conhecimento acumulado ao longo de gerações das práticas e técnicas de capturas de espécies marinhas, da sua conservação e transformação e da sua utilização culinária, a pesca e o pescado sempre tiveram uma grande importância socio-económica. Daqui resulta que Portugal, do conjunto dos países da União Europeia, é o que apresenta o maior consumo per capita, com cerca de 56,7 kg/ano, estando também acima da média europeia de 23,1 kg/ano/pessoa (Figura 3). Comparativamente com a média mundial (18,9 kg/ano/pessoa) (Figura 4), os consumos médios europeus de pecado ou marisco são mais elevados.   

Fig. 3 - Consumo de pescado e produtos de aquacultura (2010) por Estado-Membro
Na União Europeia, a espécie de pescado ou marisco mais consumido per capita é o atum em conserva com cerca de 2,14 kg/ano, sendo um peixe capturado totalmente através de pesca selvagem (Figura 5). Três quartos do consumo de pescado ou marisco provém de pescas selvagens, enquanto que os restantes consumos são provenientes da aquacultura.   

Fig. 5 - Principais espécies consumidas na União Europeia (2011)

No entanto, a tarefa de analisar o consumo alimentar específico em Portugal apresenta diversas limitações e dificuldades que se devem essencialmente à inexistência de um inquérito alimentar nacional atualizado.
  • A ferramenta existente sobre dados do consumo alimentar em Portugal, o Inquérito Alimentar Nacional, elaborado pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, data de 1980. Neste estudo a metodologia utilizada para analisar o consumo alimentar foi o registo alimentar de um dia. Em mais de 25 anos os hábitos alimentares foram mudando, quer devido à alteração das condições socio-económicas quer devido às condições políticas decorrentes da integração do país na União Europeia. Assim os dados de consumo provenientes deste inquérito não poderão ser utilizados para retratar o consumo de pescado em Portugal.
  • A Balança Alimentar Portuguesa, elaborada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), é um instrumento analítico de natureza estatística, que permite caracterizar a disponibilidade alimentar e nutricional, segundo os grupos de alimentos existentes em Portugal, mas não fornece dados de consumo. Desta forma, considera-se que apesar de serem os únicos dados mais recentes e disponíveis sobre o pescado em Portugal estes, pelos motivos descritos, apresentam também algumas limitações.
  • Estão também disponíveis os dados do estudo sobre o Consumo Alimentar no Porto. A informação presente neste relatório foi obtida através de um questionário semi-quantitativo de frequência alimentar uma vez que o objetivo é relacionar o consumo alimentar com doenças crónicas, em que o interesse reside no conhecimento da alimentação no passado, não tendo sido, por isso, especificamente desenvolvido com o objetivo primário de descrever hábitos e consumos alimentares da população. A grande limitação do estudo é o fato de ter sido realizado numa amostra da população urbana da cidade do Porto, maior de 18 anos. Ou seja, o estudo é regional, abrange apenas os indivíduos maiores de idade e apenas a residente em zonas urbanas. No entanto, e segundo os autores, não é de esperar que o consumo alimentar seja muito diferente, pelo menos das outras regiões urbanas do país.
  • Uma outra fonte de dados que embora não forneça dados diretos do consumo alimentar na Europa é a DAFNE (Data Food Networking) uma base de dados para a monitorização dos hábitos alimentares na Europa, financiada pela Comissão Europeia. Esta base de dados de consumo alimentar é muito limitada porque não apresenta dados diretos do consumo alimentar da população – baseia-se nos dados dos Inquéritos aos Orçamentos Familiares. Os dados de consumo alimentar fornecidos por este tipo de inquéritos tem por base as aquisições de um determinado agregado familiar dos vários alimentos. Ou seja, não tem em conta quer o desperdício (alimentos deteriorados que não se consomem, a porção não edível dos alimentos) quer os consumos alimentares realizados na hotelaria e restauração.



Pode assim concluir-se que os dados estatísticos existentes são insuficientes para caraterizar adequadamente o consumo de pescado em Portugal. As várias fontes de dados disponíveis apresentam discrepâncias consideráveis entre si.
 
Fig. 6 - Consumo de pescado


Benefícios vs Perigos do Consumo de Pescado


Ao consumo de produtos da pesca são atribuídos inúmeros benefícios nutricionais. Assim, estes produtos são ricos em proteínas de elevado valor biológico e lípidos constituídos por ácidos gordos polinsaturados da família omega-3, em particular os ácidos eicosapentaenóico (EPA) e docosahexaenóico (DHA), os quais se salienta a sua ação benéfica a nível cardiovascular e desenvolvimento fetal.

Todavia, se o valor nutricional do peixe é indiscutível o mesmo já não se passa com o risco de exposição do consumidor a substâncias poluentes que se podem acumular na parte edível. Entre estas substâncias destacam-se as dioxinas e os bifenilos policlorados e seus derivados (PCB), poluentes orgânicos persistentes (POP), e o mercúrio, cadmio, chumbo e arsénio, contaminantes químicos inorgânicos. As fontes destes poluentes no meio aquático podem ser de origem antropogénica, nomeadamente esgotos domésticos, industriais e os provenientes de actividades agrícolas, ou de origem natural, como as provenientes dos processos de erosão dos solos e produtos expelidos nas erupções vulcânicas. Os perigos resultantes da presença destes compostos em ambiente aquático implica não só a sua persistência e toxicidade mas também um grau considerável de concentração na cadeia trófica, o que constitui um fator de risco para a saúde humana.

Fig. 7 - Principais metais pesados encontrados no pescado e que
fazem parte do PNCA no âmbito dos contaminantes químicos

O modo de vida atual envolve o ser humano num ambiente onde a presença de metais tóxicos, ou metais pesados, é permanente e quase sempre invisível. A nossa contaminação torna-se, pois, inevitável e generalizada. Denominam-se metais pesados aqueles metais que não fazem parte da normal constituição do nosso organismo. Por isso, os nossos sistemas metabólicos não sabem como lidar com eles, nem são capazes de os excretar. Assim, os metais tóxicos passam a ser uma causa de perturbação crónica e progressiva das funções metabólicas e celulares. A absorção de metais pesados em doses diminutas, mas repetidas, acaba por se transformar numa intoxicação grave e mensurável.

Numa tentativa de se proteger dos seus múltiplos efeitos prejudiciais, o nosso organismo procura “arrumar” os metais pesados nas células ricas em gordura. Os órgãos mais ricos em gordura são o cérebro, a medula óssea e depois o fígado e os músculos. Compreende-se assim a associação que está estabelecida entre intoxicação por metais pesados e numerosas doenças, com relevo para a diminuição da capacidade cognitiva e doenças degenerativas.

A toxicidade dos metais é devido ao catião (ião com carga positiva – elemento químico instável) e não ao metal (elemento químico neutro, não reativo), sendo a forma iónica que exerce a ação tóxica. O efeito do agente tóxico no nosso organismo depende das suas características (propriedades físico-químicas), das características do ser humano (suscetibilidade biológica) e das condições ambientais.
  

SISTEMA NACIONAL DE GESTÃO DE DADOS - "Alimentos PT•ON•DATA"

 

Situação inicial em Portugal


Não existia uma base de dados analíticos nacional centralizada, pelo que os dados recolhidos estavam dispersos em diversas entidades (ASAE, IPIMAR, LNIV e INIA), em diversos formatos e suportes. Ou seja, cada entidade recolhia os seus dados, em formatos diferentes (papel, Excel, entre outros), e enviava à EFSA para esta os analisar. Pelo fato dos dados serem dispersos e, muitas vezes, a falta de dados importantes, dificultava o trabalho da EFSA na compilação de todos os dados.
















  A entidade em Portugal responsável pela Criação do sistema “Alimentos PT•ON•DATA” é o INSA, e visa a compilação dos dados recebidos de todas as entidades fiscalizadoras nacionais (ASAE, IPMA e DGAV) que depois os remete à EFSA.

Esta compilação de dados efetuada na base de dados – “SSD – Standard Sample Description” em Excel por cada entidade detentora de dados, é enviada para o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge – INSA – que insere os dados recebidos no sistema “Alimentos PT•ON•DATA” e, posteriormente transmite os mesmos à EFSA (Autoridade Europeia de Segurança Alimentar) que analisa os dados recebidos para facilitar a sua consolidação a nível comunitário.



 Como referido anteriormente, a parte prática do meu trabalho incide em duas das etapas da metodologia da avaliação dos riscos, nomeadamente com a identificação dos perigos associados ao consumo de pescado e respetiva caraterização desses mesmos perigos, através da compilação de todos os dados existentes (especialmente os metais pesados) relativamente às amostras de pescado colhidas no âmbito do PNCA.

A nova base de dados deu-se por concluída no final de 2013 e no início de 2014 todas as entidades passaram a utilizar a nova base de dados. Desta forma, a inserção de dados do pescado para a realização do meu trabalho passou já a utilizar o novo modelo.



Espero que a informação vos seja útil.

Próxima publicação: Análise de Riscos Alimentares 


Até Breve!


Fontes:

  1. Riscos e Alimentos – Pescado 
  2. Perfil de Risco dos Principais Alimentos Consumidos em Portugal 
  3. Facts and Figures onthe Common Fisheries Policy
  4. Aplicação do Índice de Qualidade (QIM) na Avaliação da Frescura do Pescado 
  5. Intoxicação por metais – Intoxicação ouReatividade a Metais (Toxicodinâmica de metais pesados) 
  6. Sebenta “Tecnologia da Carne e Pescado” – Licenciatura em Engenharia Alimentar, Instituto Politécnico de Beja
  7. Sebenta “Toxicologia Ambiental” – Licenciatura em Saúde Ambiental, Instituto Politécnico de Beja